Quando somos jovens nossa vida tem um formato geralmente padrão: temos suporte da família, todas as nossas obrigações se resumem a estudar e cuidar do nosso futuro (que sempre parece distante demais) e temos uma rede de amigos com os quais construímos nossa história. Somos bombardeados com todas as idéias que representam uma vida adulta, como adquirir bens, segurança, estabilidade financeira e nossa própria família. Mas até certa idade, temos licença para não pensar em coisas sérias, apenas aproveitar a existência, em maior ou menor grau, de acordo com nossa situação na vida.
Eu, como uma das últimas das moicanas do time das solteiras, adquiri a seguinte opinião: nada muda tanto uma mulher como o quesito “constituir família”. Pelo que observo das minhas muitas amigas casadas, casar é quase uma lobotomia. Não me parece muito sensato acreditar que para ser adulta e responsável seja necessário abdicar dos prazeres que tínhamos quando solteiras, mesmo os prazeres mais simples, como ir ao cinema com as amigas. Acuso as mulheres de abandonarem as amigas deliberadamente depois que se casam, e minha acusação fica ainda mais séria quando acrescento um ponto: nossas amigas casadas não só acreditam que estão num patamar de importância superior às meras solteiras mortais, como nos cobram presença como se elas tivessem muito mais o que fazer, e nós muito mais tempo disponível.
Mais de uma vez fui criticada pelas casadas, ainda que em tom de brincadeira, sobre “tomar jeito”. Isso por que vivo uma vida típica de solteira. Gasto dinheiro como que eu quero, viajo quando eu quero, saio e chego na hora que quero. Tenho uma amiga casada que sempre me diz: nunca a vejo desarrumada, sem unhas e cabelo feito, sempre bem vestida... mas você é solteira, tem tempo e mais que obrigação de andar assim". Hein? Desculpe...? Agora é futilidade cuidar de mim, mesma? Isso tudo vindo de uma amiga que, quando era solteira, gastava mais da metade do salário em roupas de grife? Não acho que negligenciar meus compromissos comigo mesma seja ser mais adulta, tanto quanto uma mulher que passa o dia preocupada com os horários dos filhos, com as notas do boletim, com a nutrição da família e com as necessidades do marido.
Nós, mulheres solteiras, passamos nossas vidas comemorando as conquistas e as escolhas das nossas amigas casadas, mas são raras as oportunidades (de acordo com as normas sociais) em que as mulheres casadas participam das nossas escolhas e conquistas. Por exemplo, fui sete vezes madrinha de casamento de (queridíssimas, diga-se de passagem) amigas minhas. Nas sete vezes eu gastei uma fortuna com vestido de festa, cabelo e maquiagem, presentes, passagens e viagens (quando o casamento era em outra cidade). Quando os filhos nasceram eu fui a chás de bebês e batizados, mais presentes. Se contabilizarmos, quando é que uma mulher solteira tem a chance de ser prestigiada por suas amigas, e contar com a presença obrigatória delas? Aniversário não vale, pois todos, casados ou solteiros, fazem aniversário! E as amigas casadas dão sempre uma desculpa para não vir às nossas festinhas de solteiras.
E a reclamação que as casadas vão achar mais infame da minha parte, mas é legítima, e baseada em algo que sempre ouço de uma querida amiga (que vai se reconhecer ao ler isto) é: "nunca coloque uma mulher bonita e solteira dentro da sua casa". Como assim? Por acaso as mulheres solteiras são maníacas que vão atacar o seu homem assim que você for ao banheiro por cinco minutos? Será que o fim da vida das solteiras é perseguir os maridos honestos das amigas? Será, pelo amor de Deus, que seu marido é tão gostoso assim? E por fim das contas, será o seu marido um animal anencéfalo no cio que assim que estiver diante de uma mulher solteira vai esquecer todo o amor e compromisso que tem com você? E por último, será que as mulheres casadas que frequentam sua casa são assim tão mais confiáveis que as solteiras? Cuidado... Você pode estar se enganando sobre quem é o inimigo!
Não espero que com esse desabafo eu dê a entender que estou comparando a vida das mulheres casadas e das mulheres solteiras, numa escala de melhor ou pior. O que eu quero dizer é que sim, vivo uma vida plena como adulta, porém, fiz escolhas diferentes das escolhas feitas pelas casadas. Claro que eu também queria ter encontrado já meu grande amor, claro que eu queria ter uma família minha, um bebê rosado para alimentar, fazer românticas viagens a dois e outros prazeres da vida de casada. Mas desconfio que às vezes, essas mesmas amigas que me criticam morram de saudade da época em que eram solteiras e livres. Assim como elas não desejam os problemas que eu vivo, eu também não desejo nem de longe os problemas que elas vivem.
Acredito que as mulheres casadas e solteiras possam viver em paz, e continuar a amizade que desfrutavam na juventude. E sem se criticarem pelas escolhas que fizeram. Basta entender que cada um vive a vida que escolheu viver.
Sinto muita falta das minhas amigas casadas. Mas não quero ser cobrada por ser a única a responsável por manter nossa amizade. Será que elas poderiam, entre uma mamada e outra se lembrarem de me mandar um e-mail? Prometo que, entre uma reunião ou outra, irei responder...